sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Conto popular: fadas




Na concepção de André Jolles, os contos maravilhosos, de encantamento, de fadas ou fábulas, são simplesmente contos populares, pois eles se referem sempre à moral ingênua do ser humano. É dessa forma que se pretende expor as idéias neste trabalho a partir do termo “conto popular”, pois engloba todas as expressões do homem, mas, para fins de esclarecimento em relação à literatura infantil, vale mostrar as características quanto às suas especificidades. 


Os contos de fadas surgiram na imaginação dos homens e é muito difícil precisar quando e onde ocorreu seu nascimento, apenas que deve ter acontecido há muitos séculos antes da era cristã. Eles continuam sendo transmitidos oralmente por gerações.

Em sentido etimológico, a palavra fada vem de fatum, que significa fado, destino do homem. As fadas são de origem pagã e se utilizam de objetos encantados, por exemplo, a varinha de condão para premiar os escolhidos, realizando os seus desejos. 


Há registros de que a história de Cinderela já tenha sido contada na China, durante o século IX d.C. Até na China essa história teve a sua versão, Yen-Shen, com mais de mil anos, mostrando a valorização dos pés pequenos pelos chineses que os têm como significado da virtude feminina. 


Os contos de fadas atualizam ou reinterpretam, em suas múltiplas questões universais, conflitos de poder e formação de valores, alternando realidade e fantasia. Por tratarem de conteúdos da sabedoria popular, essenciais à condição humana, é que os contos de fadas ganham importância no cenário literário. Nesses contos encontramos temas como o amor, o medo, as agruras de ser criança, as carências afetivas e materiais, as descobertas, as perdas, as buscas, a solidão, a aventura, o encontro e o final feliz, conseguido por intermédio da atuação dos elementos mágicos.


As fadas tornaram-se popularmente conhecidas como seres fantásticos ou imaginários, dotados de grande beleza, apresentados em forma de mulher. São caracterizadas pelas virtudes e pelos poderes sobrenaturais e seu papel é modificar a vida das pessoas, ajudando-as em situações de extrema urgência, quando nenhuma solução do mundo real é possível.


Em oposição à fada está a bruxa, que retrata a mulher má. É o símbolo da maldade humana. Fada e bruxa são personagens-símbolos, que representam o antagonismo do bem e do mal que, durante toda a narrativa, vão tecendo os destinos dos personagens até a vitória do bem, desfecho importante, que pode alimentar esperanças na felicidade, na justiça.


A bruxa também é, muitas vezes, lembrada pela figura da madrasta, como uma pessoa maldosa que ocupa o lugar da mãe. Na França de Darnton, o cenário é mostrado com base nos fatos reais. Muitas mulheres morriam, precocemente, na hora do parto e os homens viúvos precisavam de companheiras que criassem seus filhos, pois, naquela época, não era tarefa designada para o sexo masculino.


A essência dos contos de fadas expressa os obstáculos ou as provas que precisam ser superados, para que o herói atinja a sua auto-realização existencial, seja pelo encontro do seu “eu”, da princesa que, por sua vez, encarna o ideal almejado. As histórias não tratam de personagens, mas de figuras arquetípicas.


O conteúdo dos contos de fadas enfatiza a questão existencial. Apresentado de forma simples, com texto curto, mostra os personagens de uma maneira estereotipada e exagerada: feios ou belos, maus ou bons, valentes ou covardes e assim por diante. São representados por personagens como rainhas e reis, bruxas e fadas, gigantes e anões. 


Numa linguagem simbólica, os reis e as rainhas podem significar tradição, dignidade, poder, sabedoria; as fadas e os magos, o poder mágico; as bruxas e as feiticeiras, a maldade; as crianças, a inocência e a fragilidade.


A trama dos contos de fadas se desenrola em um ambiente mágico, semelhante a um sonho. São atemporais e não apresentam, também, espaço geográfico determinado. Acontece em qualquer lugar e em qualquer época.


Os contos de fadas, sob a perspectiva de narrativa destinada especialmente à criança, surgem na Europa durante a Idade Moderna, tendo como fontes as histórias registradas na memória dos povos, transmitidas através do tempo pela oralidade.


Na verdade, “o Conto só adotou verdadeiramente o sentido de forma literária determinada no momento em que os irmãos Grimm deram a uma coletânea de narrativas o nome de Kinder-und-Hausmärchen (Contos para Crianças e Famílias). Assim fazendo, contentaram-se em aplicar às narrativas por eles compiladas uma palavra que já vinha sendo usada há muito tempo”, argumenta André Jolles.


Já os Irmãos Grimm afirmam ser Charles Perrault quem fez a primeira coletânea de contos, ainda no século XVII, resgatando a essência do povo através de suas histórias. É ainda Jolles quem insiste sobre o entendimento do termo conto ligado ao resgate das narrativas folclóricas “sublinhemos e conservemos na memória que Jacob Grimm percebeu no Conto um ‘fundo’ que pode manter-se perfeitamente idêntico a si mesmo, até quando é narrado por outras palavras”. Esse “fundo” a que Jolles se refere é a essência que se conserva como formas simples, tomando novos rumos e transformando-se em formas artísticas, produzidas com autoria conhecida.


A maioria dos contos traduz certas similaridades com os ritos iniciáticos dos povos primitivos, em que o homem, para alcançar um outro estágio de vida, submete-se a muitos desafios que possam comprovar o seu amadurecimento pessoal.


Uma prova de que as histórias de fadas surgiram da cultura popular está presente nos personagens principais, que sempre se encontram em um estado de inferioridade no grupo em que vivem e, somente com a presença dos elementos mágicos, conseguem superar as adversidades. Os contos de fadas têm como tema os problemas existenciais ou, segundo André Jolles, “tragédias humanas” e pertenciam à cultura popular como todas as outras formas narrativas orais.


Apesar do final feliz das histórias, fica sempre a sensação de conformismo e de uma certa incapacidade de alterar a sua vida, o seu destino, uma vez que a solução sempre vem através da fantasia, dos elementos mágicos e não do esforço pessoal. Ainda assim, os contos, principalmente os de fadas, representam um contato compreensível com a sociedade. Eles não levam ao questionamento do final feliz. 


Os contos de fadas trazem à tona questões existenciais de provação, de desafio, de sensação de medo, de demonstração da capacidade de lutar e de vencer e isso não tira a credibilidade das possibilidades existenciais humanas como retrato da vida.


Por serem manifestações folclóricas as histórias de tradição oral foram contadas em inúmeras versões, acrescentando-lhes detalhes pelos narradores, dando ênfase aos significados mais importantes. Dentro da caracterização das formas literárias, os contos de fadas são confundidos com os contos maravilhosos. Ambos são contos de encantamento. Todo conto de fadas é um conto maravilhoso, mas este nem sempre é um conto de fadas.

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